Professoras de espaço maker adaptam golfe para deficientes visuais
Educadoras de Curitiba criam bolinhas que podem ser localizadas pelo barulho e permitem a participação de pessoas cegas no Golf-7, esporte adaptado à educação especial
Entre as formações continuadas que a Secretaria Municipal de Educação de Curitiba oferece aos professores, uma delas é chamada de “Práticas de Movimento”, que oferece os estudos sobre o Golf-7. Criado em 2005 pela pedagoga paranaense Fátima Alves da Cruz, o Golf-7 é um esporte baseado no jogo do golfe e adaptado ao perfil dos estudantes da educação especial: foi pensado para, inicialmente, atender estudantes com TGD (Transtornos Globais de Desenvolvimento) e DI (Deficiência Intelectual).
De acordo com a Federação Paranaense e Catarinense de Golfe, em torno de 35 mil crianças e adolescentes no Paraná já utilizam a modalidade, que apoia a melhora da concentração e coordenação, em escolas especiais.
Mas a prática ainda não existia para o público cego. Por isso, pensamos em como oferecer acesso a esse esporte aos deficientes visuais. Tudo começou com uma conversa com o supervisor estadual do paradesporto, Mario Sergio Fontes. Primeiro profissional de educação física cego no Brasil e referência dos esportes para deficientes visuais (ele presidiu a Associação Brasileira de Desportos para Cegos, apoiou a criação do golbol e futebol de 5, entre outras modalidades), Mario participou de uma formação continuada conosco e questionou por que ainda não tínhamos um material para atender os deficientes visuais.
Trouxemos, então, a pesquisa para o espaço maker da escola. Chamado Farol do Saber e Inovação Tasso da Silveira, o espaço, vinculado à Escola Municipal Maringá, é um dos 33 Faróis do município, que contam com biblioteca e acesso à internet, promovendo atividades extracurriculares, sempre no contraturno, para estudantes da rede municipal.
Fomos em busca de respostas. Vedamos nossos olhos, fizemos uma bolinha de papel, com cola e um guizo dentro. Filmamos todo o processo para, na sequência, poder assistir e estudar como a bolinha poderia ser melhorada. A ideia de usar o papel surgiu para que o próprio cego possa criar sua bolinha, uma vez que são usados materiais de baixo custo e a precisão para confeccioná-la é o tato.
Também testamos outros modelos. Com uma bolinha colorida, dessas utilizadas em piscinas de bolinhas, fizemos um pequeno corte e colocamos guizo, pedras, arroz, feijão e miçangas. Fechamos a bolinha com cola instantânea e a lixamos, para que não tivesse aderência. Realizamos os testes brincando com a bolinha e ouvindo o barulho que a mesma fazia ao realizar o rolamento.
Em outro momento, construímos uma bola com meia. Dentro, colocamos guizos. Em outra, pusemos miçangas. Realizamos os testes como da forma anterior. E entendemos que as miçangas têm um efeito melhor.
Usamos, também, um aplicativo 3D gratuito na internet, o Tinkercad. Nele, realizamos pesquisas de peso, tamanho, circunferência e raio de uma bolinha original de golfe. Por meio dos estudos feitos a partir de pesquisas no Google e em sites de golfe, conseguimos desenvolver o projeto da bolinha e o enviamos para a impressora 3D. Entre todos os modelos criados, o que teve melhor desempenho foi justamente esse, em 3D: a bolinha foi impressa em um material chamado PLA – Filamento 3D e se mostrou mais resistente e durável. Dentro dela, também inserimos miçangas.
Para entender a funcionalidade, precisávamos jogar uma partida de Golf-7. Até então nunca tínhamos tido a chance de testar a bolinha diretamente com o esporte. Fomos até a escola municipal Tomaz Edison de Andrade Vieira, que atende estudantes da educação especial e conta com um campo sintético próprio para a modalidade. Os alunos com deficiência intelectual e atuantes no Golf-7 foram nossos professores e tutores no jogo. Vendadas, realizamos testes na quadra para fazer uma imersão neste mundo, até então desconhecido para nós que enxergamos. Foi uma experiência e tanto!
Nesse mesmo dia, levamos um protótipo para o taco do Golf-7. Como nunca tínhamos jogado, não sabíamos que existem vários modelos, pois cada distância exige uma tacada. Estamos em fase de adaptação e testes desses tacos, com o apoio dos alunos de baixa visão tanto aqui da Escola Maringá quanto os da Escola Tomaz Edison, a fim de checar os pesos e os formatos diferentes. A princípio, usaremos o cabo de vassoura e material PLA.
No teste na escola, com pessoas cegas, notamos o sentimento de pertencimento e pudemos constatar como atitudes simples podem contribuir positiva e efetivamente na sociedade. Aprovada pelo Mario Sergio, a bolinha está sendo explorada na Escola Municipal Maringá e será divulgada para a rede municipal no dia 28 de setembro, durante o 7° Workshop de Educação Física. Além de colaborar para a inclusão em todas as esferas possíveis, a bolinha permite que o público cego possa beneficiar na prática do esporte, nos aspectos físico, psíquico e até mesmo social,
O que é preciso para replicar este projeto?
Além do material para a construção das bolinhas, explicado acima, as escolas podem se inspirar no regulamento específico do Golf-7 (disponível no site dos Jogos Escolares do Paraná) para levar o jogo às suas turmas. Nesta publicação do governo do Paraná, disponível para download, o professor Valdir Bento de Carvalho apresenta uma proposta do Golf-7, com planos de aula detalhados.
Todas as bolinhas podem ser adaptadas para atividades diversas, inclusive nas aulas de educação física. Algumas dicas:
Minigolfe classe especial
Os alunos podem criar um caminho com materiais diversos (como peças de Lego, cordas, cones…) para a bolinha sensorial seguir até o buraco. Taco de bets (também conhecido como taco) e palitos de sorvete ajudam a guiar a bolinha até o ponto final.
Experiência sensorial
Em duplas, uma das crianças deve ficar com os olhos vendados, sendo orientada pela vidente ao caminho correto para encaixar a bolinha sensorial no buraco de golfe.
Sinuca de quatro buracos
Com a orientação do som que o rolamento da bolinha faz, é possível tentar encaixá-la nos buracos de uma mesa de sinuca.
Percussão
Para apoiar o desenvolvimento da coordenação motora e dos movimentos, balançando as bolinhas sensoriais, a fim de observar a amplitude de timbres e singularidade do som de cada movimento.
Juliana Kanopcka Pacheco Alves - Professora da rede municipal de Curitiba (PR) há 10 anos, trabalha no Espaço Maker, com aprendizagem criativa, no Farol do Saber Tasso da Silveira. Formada em pedagogia, tem especialização em alfabetização e letramento.
Franciele da Silva Santiago - Professora da rede municipal de Curitiba (PR) há 8 anos, trabalha na Escola Municipal Maringá. Profissional de educação física, é especializada em educação física escolar.
Fonte: Portal Porvir - Juliana Kanopcka Pacheco Alves / Franciele da Silva Santiago