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“Precisamos criar tecnologias que se adaptem às realidades das escolas brasileiras”

Recém-eleito presidente da Sociedade Internacional de Inteligência Artificial na Educação (IAIED, na sigla em inglês), o professor da USP Seiji Isotani analisa as condições para o bom uso de inteligência artificial no contexto educacional brasileiro

Seiji Isotani é uma das referências brasileiras quando o assunto é inteligência artificial na educação. Docente do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP (Universidade de São Paulo), na cidade de São Carlos, é professor visitante da Universidade de Harvard (EUA). Ele foi convidado pela instituição para dar aulas no mestrado e no doutorado.

Responsável, em Harvard, pelas disciplinas “Inteligência Artificial aplicada à educação” e “Tecnologias educacionais e políticas públicas no Brasil e Sul Global”, Seiji levou à universidade norte-americana os desafios encontrados na elaboração de políticas públicas sobre o uso de tecnologias na educação brasileira e nos países do hemisfério Sul.

Entre as pesquisas que realiza no NEES (Núcleo de Excelência em Tecnologias Sociais), um dos destaques é o aplicativo “Acompanhamento Personalizado de Aprendizagem”, que utiliza IA desplugada. O pesquisador apresentou o conceito e o projeto durante a AIED 2024 (sigla em inglês para Conferência Internacional sobre Inteligência Artificial na Educação), evento que chega à América Latina pela primeira vez é realizado no Recife (PE), com organização da CESAR School. 

Primeiro brasileiro a integrar o comitê executivo da Sociedade Internacional de Inteligência Artificial na Educação (IAIED, na sigla em inglês), acaba de ser anunciado como presidente da instituição internacional responsável por avanços científicos no uso, na aplicação e no desenvolvimento da IA na educação. Ele deve ocupar o cargo no período de 2025 a 2027.

Em entrevista ao Porvir, Seiji analisa os rumos da inteligência artificial na educação. Confira:

Porvir – Quais problemas educacionais que antes eram difíceis de solucionar agora podem ser resolvidos com a inteligência artificial?

Seiji Isotani – Fico na dúvida se, no Brasil, temos clareza sobre quais são, de fato, os problemas educacionais. Identificamos vários eixos, mas pouco foi testado ou pilotado para entender se as nossas hipóteses fazem sentido. Podemos elencar grandes problemas educacionais que temos, como a formação de professores, a evasão escolar, a falta de motivação curricular, alunos com dificuldades financeiras e pais sem habilidades necessárias para apoiar os filhos na educação. A pergunta que fazemos é: Entendemos esses problemas? Vamos pegar a evasão escolar como exemplo: por que ela existe no Brasil?

Porvir – É uma questão multidimensional…

Seiji Isotani – Exatamente. Quais são essas dimensões e as interações entre elas? Por exemplo, um dos trabalhos que realizamos identificou elementos importantes como a distância da escola e a dinâmica do professor. A partir disso, começamos a entender o problema e pensar se, neste caso específico, faria sentido usar a inteligência artificial? Precisamos entender bem o problema para decidir se faz sentido desenvolver novas tecnologias ou utilizar alguma já existente.

Porvir – E qual a resposta da experiência de vocês no projeto para redação, por exemplo?

Seiji Isotani – O que fizemos foi olhar para os desafios, entender o problema do ponto de vista educacional e das pessoas envolvidas. Identificamos onde a tecnologia poderia ajudar e onde não poderia. Por exemplo, alguns problemas podem ser resolvidos sem tecnologia, enquanto outros necessitam do apoio da inteligência artificial para serem solucionados. 

Porvir – Existe uma percepção de que gestores não sabem ou não se importam em tomar decisões baseadas em dados. Como a inteligência artificial pode mudar isso?

Seiji Isotani – Temos problemas anteriores, como a integração e a qualidade dos dados. Até hoje, por exemplo, o Ministério da Educação não possui uma base de dados consolidada e atualizada sobre a quantidade de alunos em cada escola. Se você perguntar se há falta de material escolar, não há uma base consolidada para responder. Isso afeta a distribuição de livros, por exemplo, onde é necessário estimar a quantidade de alunos em cada região, muitas vezes resultando em distribuição inadequada.

Precisamos de uma infraestrutura de dados educacionais que permita decisões baseadas em informações precisas e atualizadas. Na Coreia do Sul, por exemplo, eles conseguem imprimir na hora um relatório com o número de alunos e professores em cada escola. Com isso em mãos, podem tomar decisões muito mais precisas. Aqui no Brasil, se um aluno muda de estado, os dados se perdem, o que dificulta o acompanhamento. 

Porvir – O que vai fazer a inteligência artificial chegar à sala de aula brasileira e ser bem utilizada?

Seiji Isotani – A inteligência artificial enfrenta várias barreiras. Precisamos redesenhar as tecnologias para que não dependam tanto de internet ou habilidades digitais dos professores. Minha palestra abordou justamente isso: como criar tecnologias de IA que funcionem mesmo com limitações de infraestrutura e habilidades digitais. Chamamos isso de “IA desplugada na educação”. Temos que pensar em diferentes níveis de conectividade e como lidar com essas situações. Precisamos criar tecnologias que se adaptem às realidades das escolas brasileiras.


FONTE:WWW.PORVIR.ORG


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