Inverter o planejamento de aula torna os objetivos de aprendizagem mais claros
Formação da Khan Academy, em parceria com a Sincroniza Educação, mostra como a metodologia do planejamento reverso traz dinamismo ao plano de aula, estimulando a participação dos estudantes
Começar a planejar a aula pelo fim, com foco naquilo que se espera que o estudante compreenda, para depois definir a ação pedagógica. Em linhas gerais, inverter a lógica do planejamento da aula é a premissa do planejamento reverso, metodologia ainda pouco conhecida entre professores, mas bastante eficaz na proposta de ensino-aprendizagem.
A estratégia do planejamento reverso, intitulada originalmente como “Backward Design” pelos educadores Grant Wiggins (1950-2015) e Jay McTighe, sugere três etapas que devem ser construídas: identificar os resultados desejados, determinar evidências aceitáveis e, por fim, planejar as atividades.
As professoras Mariana Rodrigues Damaceno, da EMEF Cândida Dora Pino Pretini, em Rio Claro (SP) e Rosangela Griep, do IFMT (Instituto Federal do Mato Grosso), do Campus Sorriso, acabaram de conhecer e aplicar a metodologia. Ambas são alunas da Khan Academy Experts, voltada para apoiar o desenvolvimento dos educadores brasileiros de maneira online e gratuita. O projeto oferece a professores de matemática, ciências e língua portuguesa uma trilha formativa de seis webinários, com atividades práticas para o planejamento pedagógico.
Da teoria à prática
Um dos módulos estudados por Mariana e Rosangela foi, justamente, o planejamento reverso. Com o apoio da Sincroniza Educação durante a formação, ambas tiveram a chance de aplicar em sala de aula os aprendizados das quatro etapas do modelo RETA (sigla para Resultados desejados, Evidências de aprendizagem, Tarefas avaliativas e Atividades de aprendizagem), criado pela Sincroniza para facilitar o entendimento do conceito.
“É inovadora a maneira como os autores Wiggins e McTighe propõem uma estrutura de planejamento que pensa primeiro na aprendizagem, depois no que é preciso coletar para as evidências para só depois definir as atividades que serão desenvolvidas com os estudantes. O modelo RETA é a leitura da Sincroniza para ensinar o planejamento reverso de uma maneira mais didática”, explica Ana Paula Manzalli, diretora de conteúdo formativo da empresa. “Percebemos que falar de evidências não era tão trivial. Por isso, separamos o conteúdo: primeiro, você define as evidências que precisa coletar para verificar a aprendizagem, e depois você elabora as tarefas avaliativas com as quais você poderá obter essas evidências”, complementa Ana.
Professora de língua portuguesa, Mariana realizou, com a turma do 8° ano, uma atividade para que os alunos pudessem estudar e entender a diferença entre “mais, más e mas”. Além do planejamento reverso, ela contou com o apoio dos Recursos Educacionais Digitais, os REDs. Mariana começou a aula com frases na plataforma Plickers, gratuita, que também conheceu com o curso, para que eles reconhecessem os erros em um teste rápido. Depois da exibição de um vídeo na plataforma YouTube Edu com exercícios de fixação, voltaram ao Plickers. E, ao final, produziram seus enunciados com os termos estudados. O percentual de acerto foi de 88%.
Mariana relembra que, ao final da atividade, a cada acerto, os estudantes recebiam um selo simbólico no caderno, animando ainda mais a aula. “O curso me inspirou a usar a metodologia e os recursos oferecidos no processo. A metodologia foi muito bem explicada, de forma simples e muito prática, e me ajudou a pensar a aula de uma forma diferente, mesmo com poucos recursos”, ressalta. O retorno dos alunos a surpreendeu. “Eles são agitados, mas todos prestaram atenção nos recursos digitais. A aula se tornou mais dinâmica, todos participaram”, comemora a professora, que está se preparando para aplicar outros REDs apresentados no curso em suas aulas.
Organização e trabalho coletivo
Com a turma do 1° ano do ensino médio, a professora Rosangela Griep, de matemática, utilizou o planejamento reverso para trabalhar o uso de gráficos voltados para reconhecer funções. “A aplicação de modo geral, foi fácil. Já havíamos estudado os conceitos de funções em aulas anteriores, mas fazer conjecturas por meio de tabelas e gráficos sempre é um obstáculo para o estudante até o momento no qual ele se torna protagonista e cria uma situação em que compreende as relações que são ou podem ser utilizadas para determinar uma função polinomial de 1º grau. A simulação utilizada no final permite que o estudante manipule as variáveis sem medo de estar fazendo algo incorreto”, comenta Rosangela.
Ela se apoiou na exibição de vídeos curtos e atividades da Khan Academy, bem como no PhET, plataforma da Universidade de Colorado (EUA) com versão em português, que permite simulações interativas para ciências e matemática, oferecendo ao estudante a chance de verificar instantaneamente o que aprendeu sobre o assunto.
“Acertar é motivo de comemoração e de expressões como: ‘Que fácil!’, ‘Aprendi, professora!”, conta a educadora. “Usar tecnologias digitais nos permite um retorno mais efetivo dos estudantes nas atividades propostas”, afirma. Rosangela passou a adotar o planejamento reverso principalmente para a revisão do conteúdo e verificação de aprendizagem.
Apoio dos Recursos Educacionais Digitais
Uma vez que o planejamento reverso está definido, os REDs podem ser utilizados tanto para as tarefas avaliativas quanto para diversificar as experiências de aprendizagem, explica Ana Paula Manzalli. Para ela, antes de selecionar um produto ou serviço, é preciso colocar a intencionalidade em primeiro plano. “Uma dica que eu daria para os educadores para facilitar a escolha de REDs no dia a dia é fazer uma curadoria com algumas opções gratuitas e abertas. Hoje, é possível buscar conteúdos e atividades até mesmo pelo código de habilidade da BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Vale ter uma lista enxuta, de quatro ou cinco REDs que sejam flexíveis, adaptáveis e da sua confiança. Ao longo do tempo, você pode ir agregando mais ferramentas à lista”, sugere.
Para a professora Mariana, o maior desafio ao aplicar os REDs está na estrutura da escolas, em especial no ensino público. “Atuo em uma escola de uma zona periférica, onde há uma carência maior de estrutura. Mas, mesmo assim, é possível encontrar uma forma de fazer acontecer. Tenho me esforçado para aprender um pouco mais sobre os REDs”, reforça. Já Rosangela diz que o apoio dos REDs ganhou sentido em seu planejamento em 2020, quando foi necessário colocar o ensino remoto em prática. “Hoje, 50% das minhas aulas contam com demonstrações em ferramentas digitais”, comenta.
No texto Professor-curador: o percurso de aprendizagem ativa e o planejamento reverso, publicado aqui no Porvir, a fundadora da MAPA Metodologias Ativas, Renata Salomone, reforça a importância da intencionalidade pedagógica citada por Ana Paula e o contexto da sala de aula na seleção dos REDs: “Deveríamos pensar no trabalho do professor como curador, agindo como um desenhista de percursos aprendentes e proporcionando experiências significativas. A seleção de conteúdos deve fazer parte de uma grande história que será construída COM e não PARA os alunos. As obras de arte sempre serão feitas de encontros. Os estudantes também são responsáveis pelas suas criações, na medida em que as interpretam a partir de suas vivências.”
Fonte: Portal Porvir - Ana Luísa DMaschio